segunda-feira, 15 de março de 2010

Leitura a dois

Tende ao desespero com o livro na mão.
Abre-o com energia, macula a clareza das palavras.
Grita por dentro, busca uma força para continuar a lendo.
Aperta-o com força, extinguindo a limpidez da poesia.

Tende, tende ao desespero.

Vira as páginas rasgando-as internamente,
Dói, oh, dói.

Ponto: uma contração junto ao peito, um dilaceramento inquestionável…
Vírgula: um nó na garganta.
Exclamação: a admiração de uma vida surpreendida (ao que nos concerne, o céu que nenhum de nós vê, a farsa que nenhum de nós tem sozinho…).
Interrogação: uma queda de 20 andares.
Reticência: a indecência, céus, a decadência…

Tende, tende ao desespero com o livro na mão.

E de leitura a dois eu entendo, sim, disso eu sei.
Dança um tango e lê um livro a dois, quem sabe no qual se dará melhor?
Se teu par for fiel, se teu par for capaz, sim!, será bom.

Mas das minhas incoerências só eu poderei me libertar um dia.
E, quem sabe, quem sabe se lá eu tenho poder algum sobre alguma coisa na minha vida
Ou ser boi e mascar a grama, mais nada.

Quem sabe se será bom, quem?
Diz-me enquanto é tempo, amor.
Diz-me que o tempo ao menos valeu a pena…

Leitura a dois: tendo ao desespero.

Nenhum comentário:

Postar um comentário