sexta-feira, 14 de maio de 2010

Aos anjos o que é próprio dos anjos

O anjo mais cruel que existe foi aquele que caiu das nuvens do seu senhor e teve as asas arrancadas no inferno à lâmina quente. Seus vícios eram como os meus, seus pecados também. Nos seus lábios eu li o futuro entre cortes, nas suas mãos eu apreciei o sofrimento.
Cansado das andanças ermas pelo deserto e pela cidade, o invisível rubor da indiferença subiu-lhe às faces. Trazia na pele encouraçada de poeira as cicatrizes já abertas, tal o martírio que lhe pertencia.
Pobre! Nem o Diabo lho aceitava; sua Via Crucis era inútil. Fora sempre imperfeito nos seus caminhos, até o último de seus dias. E eram esses dias feitos de trabalhos sucintos, porém intermináveis. Certa vez, começou a cavar sete léguas por mão, de novo, até o inferno.
Todo o seu ser era maculado e nos seus olhos nem uma gota do sagrado antigo lhe restava. Ele sangrava pelos poros.
Foi naqueles olhos que eu jurei ver o tormento eterno. Nunca conheci quem amasse tanto.

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