sexta-feira, 16 de abril de 2010

Drama do Vigia

Não era mestre em nada,
Era doutor de porcaria nenhuma.
Escutava seu samba com o CD riscado
Nas músicas que mais gostava, em suma.
Nos olhos já vidrados
E guiados pelo café,
A agitação da vida interior
De longos domingos sem fé.
Mas era sempre o mesmo senhor
Qu'estava ali.
É,
Era sempre o mesmo humor
Que restava ali.
E, de tempos em tempos, seus filhos lho ligavam
Com a desculpa despretenciosa de que o dinheiro acabara.
Porque, de tempos em tempos, ele enchia a cara
com o mesmo pouco dinheiro que lhe pagavam.
E era sempre a mesma vida levada
Por um homem que não admitia viver sem sua mulher.
Sempre a mesma vida pesada
De quem não sabe o que quer.
Acredite,
era sempre o mesmo senhor
qu'estava ali, é, era sempre
o mesmo humor que eu sempre vi.
Só e com seu pingado cinza,
Ele guardava os carros de sua cidade cinza.
Transtornado pela falta de alma,
As luzes que piscavam dilatavam seu humor ranzinza.
(E era sempre o mesmo senhor qu'estav'li.)
Assim como o CD riscado -
Riscada era a vida nas partes poucas que gostava,
Sendo tudo mais entediante
Do que deveria, por outro lado.
Ele nunca descansava da vigília
Mesmo até do alto do seu prédio, com o fog londrino.
Um dia, ele foi até a borda
E caiu retamente para voltar a ser menino.
15/04/10.

3 comentários:

  1. Nossa, AMEI esse. Principalmente o ritmo... Parece uma música. *_*

    O Ousadia também ficou muito bonito... Foram os dois que eu mais gostei entre esses últimos. x)

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  2. Que estava ali.
    Qu'estava ali.
    Qu'estava'li.

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  3. Sabia que encontraria coisa boa aqui nos antigos. Drama do vigia e do resto do mundo que não sabe como ser só.

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